logo_viva_agreste

Teatro de rua: conheça o trabalho de grupos teatrais do agreste

O teatro de rua é uma das tantas modalidades dessa arte milenar que circula o Brasil e o mundo. Aqui no Agreste não é diferente, pois existem alguns coletivos que trabalham levando o teatro para ambientes públicos, mesmo enfrentando diversas dificuldades.

Para os especialistas na linguagem, a grande diferença entre os outros tipos de teatro e o teatro de rua é que esse último leva a arte para onde as pessoas estão, seja uma praça, parque, feira livre etc.

Teatro de rua aproxima o público dos atores
O teatro de rua é o berço dessa linguagem, pois antigamente os espetáculos eram apresentados em espaços públicos (Foto: Kaká Bezerra)

Portanto, torna-se uma experiência mais democrática e acessível, atingindo públicos que têm dificuldades de deslocamento para as tradicionais salas de teatro ou que não possuem condições financeiras para a compra de ingressos.

Para entender mais sobre o teatro de rua e conhecer o trabalho de agentes culturais que também atuam com essa linguagem na região do Agreste, conversamos com Marilia Azevedo do Coletivo Poeira, Pedro Henrique do Teatro Experimental de Arte (TEA) e com Stephany Metódio do Coletivo Tear.

Afinal, Como é fazer teatro no interior?

É notável a riqueza de artistas, grupos, manifestações e ações artísticas em Pernambuco. No entanto, quando o assunto é a distribuição de bens culturais, os grandes centros urbanos conseguem ser um pouco mais equalitários.

De acordo com os nossos entrevistados, o acesso dos grupos teatrais das cidades do interior aos bens culturais e editais é precário e escasso, quando não inexistente.

“A falta de um olhar da gestão municipal para a área, a falta de incentivo dos profissionais da cultura residentes na cidade e a total ausência de equipamentos para o fazer teatral contribuem para um cenário de grandes obstáculos para a produção teatral. As políticas públicas estaduais ainda concentram a maioria de seus recursos na RM [Região Metropolitana], apesar da luta constante, ainda é pequeno o percentual no interior”, explica Marilia Azevedo.

Além desses desafios, Sthephany Metodio acrescenta uma outra problemática que é consequência da falta de apoio e do acesso insuficiente dos artistas aos bens culturais: há uma grande dificuldade em formação de plateia.

Ainda segundo a integrante do Coletivo Tear, a solução para esses problemas não pode ser simplista. É necessário colocar em prática várias ações, que em conjunto transformam a maneira de se fazer teatro e outras linguagens artísticas no inteior.

Coletivo Tear trabalha com teatro de rua e outras linguagens
A formação de plateia também é um desafio para quem faz teatro no interior de Pernambuco (Foto: André Amorim)

“Se houver um fortalecimento no incentivo através de editais de fomento, formação e fruição mais voltado para interior do Estado, qualificação de espaços para ensaio e apresentações, fomento para os espaços culturais independentes, criação e fortalecimento dos sistemas municipais de cultura, diálogo com os coletivos, associações e conselhos, no intuito de entender as necessidades de cada território, e uma melhor distribuição, não só dá quantidade de projetos, mas sobretudo do valor dos recursos entre o interior do estado e a região metropolitana, com certeza esta produção poderá se potencializar”, completa Sthephany Metodio.

Pedro Henrique, do TEA, concorda com as pontuações das profissionais e acrescenta o poder transformador que a arte, de uma maneira geral, possui.

“Mundo afora temos exemplos magníficos de sociedades que enxergaram esse potencial e hoje colhem os frutos desse olhar diferenciado para arte. É preciso entender cultura como pilar fundamental de construção humana e a partir daí promover políticas públicas efetivas, retirando a arte de um lugar de dependência dos governos e gestões”, finaliza.

Coletivo Poeira, Belo Jardim, Agreste Central

Desde 2017, o Coletivo Poeira vem trabalhando com contação de história, teatro, pesquisa e fruição, se tornando uma referência nessa linguagem na cidade de Belo Jardim, Agreste Central de Pernambuco.

Formado por CÍntia Souza, atriz e produtora executiva;  Faelbi Antônio, ator e produtor técnico; Marilia Azevedo, atriz e diretora artística; e Wallace Cruz, ator e produtor técnico, o grupo ainda conta com outros profissionais parceiros.

“O Poeira não é essencialmente um grupo de teatro de rua. Na verdade fazemos teatro ‘na’ rua e não apenas nela, também fazemos em terreiros na zona rural, bibliotecas de escolas, salas de aula, salões e nos mais variados espaços públicos ou que a iniciativa privada nos abra”, explica Marilia.

O Coletivo Poeira é uma referência de teatro em Belo Jardim
O Coletivo Poeira trabalha com espetáculos, oficinas, cursos e formações (Foto: Edulizou)

Segundo a atriz, esse movimento acontece em parte porque o Poeira quer que o teatro alcance públicos diversos e por isso o coletivo adapta o trabalho para chegar em qualquer espaço. No entanto, o grupo também sente a ausência de equipamentos públicos específicos para receber espetáculos.

“Observando isso o Poeira pensou: se na cidade não há um espaço pensado para que seja possível acontecer teatro, então vamos fazer com o que o nosso teatro possa aconteçer em todos os espaços. Essa decisão interfere na estética dos nossos trabalhos (pois temos que pensar em estruturas, cenário, roupas, etc. que se adaptem aos espaços) e também reflete o posicionamento do nosso fazer teatral diante da sociedade”, pontua.

Desta forma, o Coleitvo Poeira circula Belo Jardim e região com três espetáculos, são eles: “Uma história com mil-robôs macacos” e “Num reino cor de burro quando foge” (teatro para as infâncias), e “No Rastro do Encantado” (teatro para rua).

“Além dos espetáculos temos projetos de formação como grupos de estudos e oficinas voltadas para teatro”, completa a atriz.

Uma história com mil-robôs macacos

Crianças brincando de teatro contam a história de uma pacata cidade onde uma cientista desenvolve um chip capaz de realizar grandes coisas. Mas onde testar? Em quem? Robôs? Macacos? Robôs-macacos? E o que se inicia como uma história divertida pode terminar em uma roubada com muito café e pão.

(Foto: Edulizou)

Num reino cor de burro quando foge

Em um reino onde todos tem água em abundância, as pessoas que vivem ali não percebem o desperdício diário, até que um dia a chuva para de cair. Mas a sábia coruja, a moça da pipoca e um viajante vão se propor a resolver esse problema.

(Foto: Edulizou)

No Rastro do Encantado

O boi do capitão se perdeu, e Mateus e Bastião vão partir numa jornada de encantos e assombrações para tentar recuperá-lo. No Rastro do Encantado é um louvor às festas e brinquedos tradicionais, à identidade e à memória da produção dos artistas populares do Brasil.

(Foto: Kaká Bezerra)

Teatro Experimental de Artes (TEA), Caruaru, Agreste Central

Fundado em 16 de julho de 1962, o TEA já nasceu com a preocupação de instituir um fazer teatral pautado na pesquisa, levando os atores a se entenderem enquanto seres humanos e a questionarem suas relações  com o próprio território.

“Pensando nisso Arary Marrocos e Argemiro Pascoal, juntamente com um grupo de artistas, decidiram criar um grupo de teatro que proporcionasse esse novo olhar. O casal então transforma a garagem de sua casa em um teatro e desde sua fundação oferece um Curso de iniciação teatral gratuito“, conta Pedro Henrique, integrante e professor do TEA.

Grupo é o segundo mais antigo em funcionamento no Brasil
O TEA oferece curso de iniciação teatral gratuito (Foto: Arquivo pessoal)

Atualmente, o Teatro Experimental de Artes é o segundo grupo mais antigo em atividades ininterruptas do Brasil, além de ser Patrimônio Vivo de Pernambuco e Ponto de Cultura do Estado.

Com a intenção de fomentar ainda mais a produção artística no meio estudantil, o filho do casal, Fábio Pascoal, e Chico Neto, criaram o Festival de Teatro do Agreste (FETEAG), em 1981. Hoje, o festival já é reconhecido internacionalmente.

“Além dos quase 80 espetáculos encenados ao longo dos 60 anos, temos as oficinas de iniciação, seminários, oficinas de formação e o Festival”, completa.

Auto da Compadecida

Há 12 anos, o TEA tem em cartaz o espetáculo Auto da Compadecida, uma grande celebração a cultura popular, ao folguedo Cavalo Marinho e obra e memória do Mestre Ariano Suassuna.

O Auto da Compadecida é uma das principais peças do TEA
Há 12 anos o espetáculo circula por Caruaru, região e outros estados do Brasil (Foto: Arquivo pessoal)

Coletivo Tear, Garanhuns, Agreste Meridional

O Coletivo Tear é encabeçado pela atriz e produtora cultural Stephany Metódio, pelo músico, compositor e poeta Alexandre Revoredo e pela historiadora, designer de moda e produtora cultural Katarina Barbosa.

Nascido em 2009 através do teatro, o coletivo se chamava “Tearteatro”. Depois, por falta de condição de ser apenas um grupo de teatro, passou a ser um coletivo de artes integradas, buscando criar, fomentar e solucionar problemas relacionados à produção artística a partir da junção de outras formas de se fazer arte.

“A ideia de um coletivo é uma ideia de funcionamento horizontal, mantida através de ações que podem ser monetizadas através de patrocínios ou de venda de produtos artísticos (Shows, apresentações de teatro, cds, livros, quadros, camisetas e souvenirs), editais públicos e de incentivo fiscal e prestações de serviço, onde cada ideia de concepção artística se transforma em projeto e em linha de produção para a execução do mesmo”, explica Stephany.

Música, produção, teatro e moda são algumas linguagens trabalhadas no Tear
Além de teatro, o Coletivo Tear trabalha com outras linguagens (Foto: Juliene Moura)

Assim, desde 2011, os artistas, Stephany, Revoredo, Katarina e artistas colaboradores, trabalham com elaboração e execução de projetos culturais, produção de eventos, captação de imagens e áudio, montagem de exposição, mediação criativa, prestação de serviços artísticos para empresas e realização de oficinas nas áreas de Teatro, Música, Literatura, Artes plásticas, Audiovisual, Moda e Dança.

Além disso, o Coletivo Tear também realiza o evento bienal “TeArte – Viva o coletivo!” que já reuniu mais de 80 artistas de diferentes linguagens da cidade de Garanhuns e da região do Agreste Meridional de
Pernambuco.

Também é idealizador e responsável pela ação mensal “Studio Tear” , de fomento e intercambio da música autoral com as artes integradas na intenção de formar plateia, críticos e formadores de opnião para o universo artístico;  da Mostra Mundaú de Canções – MOMU, mostra de música autoral de Garanhuns; e mantém uma editora cartona independente, a Severina Catadora.

“Desde de 2015 o Coletivo Tear abriu as portas de sua sede, intitulada Aldeia Tear, um espaço cultural independente, que funciona como Galeria de Arte, Espaço Coworking, Studio de música, Ateliê de artes plásticas, sala de shows, apresentações e sala de ensaio, além dos outros serviços que já são realizados, produção de artistas e de atividades culturais e empreendimentos criativos em geral”, finaliza.

Luanda Ruanda – Histórias Africanas

Espetáculo infanto-juvenil de narração oral com música, trazendo a temática afro-brasileira que, esse ano, completa 10 anos de estrada e já circulou por mais de 15 comunidades quilombolas no estado de Pernambuco, além de diversas apresentações nos principais festivais do Estado.

(Foto: Fernando Pereira)

Histórias da caixola

Espetáculo infantil de narração oral com música que trabalha contos contemporâneos, canções e parlendas através da estética do teatro do objeto. O espetáculo em 2023 completa 10 anos de atividades e já circulou pelo estado de Pernambuco, Bahia e Santa Catarina.

Ayô – Histórias de Griô

Intervenção mambembe de narração oral com música que traz a temática afro-brasileira que está em fase de experimentação.

O que é teatro de rua e qual sua importância?

Para Pedro Henrique, o teatro de rua não restringe a experiência de apreciação artística a uma determinada classe ou a um público que possa pagar. “Esse encontro na rua entre artistas e plateia é muito genuíno e verdadeiro, sendo esse o berço de tudo que conhecemos por teatro atualmente.”

Stephany Metódio destaca também a versatilidade desse modo teatral, uma vez que ele pode se adaptar a diversos espaços, sejam eles aberto ou não.

“Acreditamos que utilizar o espaço da rua, a casa do povo, para a intervenção artística nos aproxima do próprio povo, o formato do teatro de rua, que por sua vez, é essencialmente engajado, sua luta por uma sociedade mais pluralista e justa é passível de ser observada na história. O espaço escolhido (a rua/ o terreiro/ as calçadas/ as portas e as casas das pessoas) para realizar os espetáculos, contar as histórias, naturalmente popular e sem hierarquias contribui para essa ideologia e os diferencia dos demais teatro”, explica a atriz e produtora.

Assim como o teatro, outras linguagens artísticas têm o poder de transformar a vida de toda a sociedade. Segundo Marilia Azevedo, eles “promovem a cidadania emancipatória por meio da difusão de conhecimento, fruição, e de processos que contribuem para fortalecer o senso de comunidade, identidade e o respeito para com a diversidade.”

Desta forma, o teatro funciona também como ampliador educacional, social e psicossocial e contribui para o desenvolvimento nas áreas onde se efetivam. “Usufruir dos bens culturais é direito constitucional de cada cidadão brasileiro”, frisa a integrante do Coletivo Poeira.

Além de todos esses benefícios, os artistas também ressaltam a importância do teatro para a economia local e regional, uma vez que essa linguagem emprega um vasto número de outros profissionais, contribuindo com a geração de renda em diversos setores.

Gostou de conhecer mais sobre o teatro de rua e o trabalho dos grupos teatrais do Agreste de Pernambuco? Então compartilha esse conteúdo com aquela pessoa que também vai amar fortalecer a cultura da nossa região!

últimos artigos

Leia também...

No more posts to show