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Produção Cultural no Agreste: dados, desafios e perspectivas de quem faz a cultura da região

Anualmente, o Governo de Pernambuco disponibiliza, através do Funcultura, quatro editais de fomento a produção cultural do Estado, são eles: Edital Funcultura Geral, Edital Funcultura Música, Edital Funcultura Audiovisual e o Microprojeto Cultural.

Com a pandemia do Covid-19, além do Funcultura, o Estado e os municípios pernambucanos também tiveram recursos da Lei Aldir Blac (LAB), uma lei de caráter emergencial para fortalecer a cultura e os agentes culturais de todo o País. Este ano, os produtores culturais também vão contar com a LAB 2 e a Lei Paulo Gustavo, sendo esta última voltada, em sua grande maioria, para o audiovisual.

Mas, como é a realidade da produção cultural no Agreste de Pernambuco? Como coletivos e agentes culturais estão organizados para todas essas oportunidades? E como é feita a distribuição desses recursos por parte do poder público?

Buscando respostas para essas dúvidas e com o intuinto de visibilizar ainda mais o trabalho dos artistas e fazedores de cultura agrestinos, o Viva Agreste entrevistou o integrante da Ripa, André Chaves, o produtor cultural e poeta, David Biriguy e a artista e produtora cultural Stephany Metodio. Acompanhe nossas descobertas!

Ripa e o cenário cultural do Agreste

Durante muitos anos, produtores culturais, artistas e coletivos do interior denunciaram a centralização da cultura pernambucana e dos incentivos à arte na Região Metropolitana do Recife. Diante de tantos anseios, os artistas criaram a Rede Interiorana de Produtores, Técnicos e Artistas de Pernambuco (RIPA), em 2020.

Atualmente, estão cadastrados na Ripa 411 coletivos e agentes culturais do interior de Pernambuco, divididos nas seguintes categorias: Teatro, Música, Audiovisual, Artes Visuais, Cultura Popular, Literatura, Dança e Moda.

A RIPA existe desde 2020 e tem como objetivo ser uma ponte entre fazedores de cultura do interior de Pernambuco e gestores (Foto: Divulgação)

Especificamente no Agreste de Pernambuco são 142 cadastrados, espalhados em 21 cidades, sendo 127 agentes culturais e 15 coletivos. Desse montate, 93 não possuem sede, enquanto que 49 possuem espaço próprio.

A região de desenvolvimento com mais presença é o Agreste Meridional (57), seguido do Agreste Central (56) e pelo Agreste Setentrional (29). As cinco cidades com mais artistas cadastrados são: Garanhuns com 39, Caruaru com 36, Buíque com 9 cadastrados, Surubim com 8 e Santa Cruz do Capibaribe com 5.

“A Rede tem como objetivo mapear e promover trocas de saberes e fazeres entre fazedores da cultura do interior pernambucano, e age em frentes de atuação voltadas a luta por uma política cultural que possa dar conta de atender a diversidade de produção e potência dos territórios interioranos, distribuição de recursos públicos e construção de um pensamento decolonial na fruição, formação e difusão das artes no interior”, explica um dos integrantes da rede, André Chaves.

A proposta é encurtar as fronteiras de diálogo entre os profissionais da cultura com o poder público, sendo uma ponte para pautar as lutas e necessidades dos fazedores de arte no interior.

Desde 2020, a rede de artistas, técnicos e produtores culturais vem realizando reuniões com o poder público e emitindo notas que pressionam as autoridades. Foi assim durante a LAB e, desde março, eles travam mais uma luta, o destravamento de recursos públicos do Funcultura.

Como é a produção cultural no Agreste na visão dos fazedores de cultura?

Para muitos artistas do Agreste, a produção cultural surge como uma necessidade em suas carreiras. Pela ausência de políticas públicas culturais em seus municípios, e consequentemente a falta de espaço para expor seus trabalhos, artistas passam também a produzir eventos.

Foi o que aconteceu, por exemplo, com o poeta David Biriguy. Segundo o belo-jardinense, ele começou com a produção para que pudesse fazer seu trabalho circular e para potencializar a cena cultural da cidade. No entando, ainda há um longo caminho pela frente.

Biriguy trabalha com poesia, música, cinema e arte-educação (Foto: Heleno Florentino)

“Os incentivos estão começando a vir para cá recentemente, porque se você for olhar de uns 5 a 6 anos atrás ninguém acessava o Funcultura. Agora que vieram essas outras leis de incentivo, devido a pandemia, que deu uma democratizada”, explica o artista.

Produtor do festival Tabacaria do Mago Apresenta, do Jardins da Literatura e do Terreiro de Arte Ilê Convida, Biriguy conta as dificuldades que existem para que pessoas do interior possam acessar os editais do Estado de Pernambuco.

Prazos curtos, burocracias e falta de espaços públicos para apresentações artísticas nas cidades do interior são algumas das problemáticas citadas pelo artista.

“Até para fazer o cadastro [de produtor cultural] é pouco tempo, as vezes é só uma semana. Eu acho que o desafio também é maior em cidades menores, porque elas não têm equipamentos. Belo Jardim, por exemplo, não tem um teatro. Então assim, é você trabalhar e produzir em uma parada que não tem mercado na cidade que você atua. Produzir cultura no Agreste, no interior, é muito difícil”, pontua o poeta belo-jardinense.

Além de todas essas questões, Biriguy também chama a atenção para a centralização das unidades públicas na Capital. “Eu acho que deveria ter uma unidade da Fundarpe em cada região para ser justo, porque imagina que alguém que quer ir de Petrolina para a secretaria de cultura do Estado? Imagina o quanto essa pessoa tem que andar? Eu acho muito injusto e acaba ficando tudo por lá.”

Para a produtora e artista, Stephany Metódio, outro grande desafio é a formação de público. Se não há investimento em incentivos culturais, não há apresentações e, consequemente, não existe a possibilidade de despertar o interesse de um público.

CEO do Coletivo Tear, do espaço cultural Aldeia Tear, do Selo Musical Studio Tear e da editora Cartonera Severina Catadora, Stephany também é integrante do grupo gestor da RIPA e acredita na força do coletivo para alcançar novos horizontes.

Stephany Metódio é atriz, contadora de histórias, poeta-declamadora, produtora, curadora e gestora cultural (Foto: ristiane de Souza)

Em 2013, o Coletivo Tear promoveu o “TeArte – Viva o coletivo!” , evento que reuniu 60 artistas de diversas linguagens para fruirem suas produções em Garanhuns, durante cinco dias seguidos. De acordo com a artista, essa foi a maior movimentação artística independente promovida na Cidades das Flores nos últimos 30 anos.

“O Coletivo Tear e suas iniciativas movimentam a cena artístico-cultural pernambucana nas mais variadas frentes de trabalho, gerando renda, emprego, acesso, fomentando a criação artística e democratizando a cultura de todo um território geo-político de forma responsável e funcional indo em contraponto às políticas públicas culturais daquele lugar”, completa Stephany Metódio.

Perspectivas de quem faz cultura no interior de Pernambuco

Segundo André Chaves, a RIPA entende o Funcultura como um importante mecanismo de fomento à produção cultural de Pernambuco, mas é necessário corrigir algumas fragilidades que acabam impossibilitando a distribuição justa e igualitária dos recursos em todas as regiões do Estado.

“O processo é longo, e a luta é constante, uma vez que somente em 2021 tivemos a digitalização do processo de submissão de propostas aos editais. Mas, apenas esta atualização aliada às políticas de regionalização, não é o suficiente para dar conta da dívida histórica do governo com os interiores. É preciso formar, é preciso estar junto, é preciso desburocratizar mais“, defende o integrande da rede de artistas.

Para David Biriguy, é necessário que o Governo do Estado esteja junto das prefeituras e das secretarias de cultura das cidades, principalmente do interior. “Tem que fazer um trabalho para estruturar as secretarias de cultura, no sentido de formação mesmo, porque é um monte de gente que não sabe o que está fazendo”, revela.

Já para a atriz, produtora e pesquisadora de Garanhuns, o único jeito de mudar essa realidade e potencializar a produção interiorana, é tomando uma série de medidas em conjunto.

“Se houver um fortalecimento no incentivo através de editais de fomento, formação e fruição mais voltado para interior do estado, qualificação de espaços para ensaio e apresentações, fomento para os espaços culturais independentes, criação e fortalecimento dos sistemas municipais de cultura, diálogo com os coletivos, associações e conselhos, no intuito de entender as necessidades de cada território e uma melhor distribuição, não só dá quantidade de projetos, mas sobretudo do valor dos recursos entre o interior do estado e a região metropolitana, com certeza esta produção poderá se potencializar”, finaliza Stephany.

Para ficar por dentro das ações da Ripa, siga o perfil da rede no Instagram. Além das reuniões abertas, o grupo também realiza formações, tira dúvidas e auxilia os fazedores de cultura do Estado. Para se cadastrar e fortalcer o movimento, preencha o formulário.

E você, o que acha da produção cultural desenvolvida no interior do Estado? É importante lembrar que o acesso à cultura e aos bens culturais é um direito de todos os brasileiros e está presente na Constituição Federal. Então, cabe aos governos e gestores prezarem para a distribuição justa dos rescursos de incentivo, valorizando profissionais de diferentes regiões e beneficiando populações diversas em todo o terrirório.

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