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Tradição, cultura e fé: Dia de Reis dos Povos Xukuru, em Pesqueira

Os conjuntos de montanhas, Serra do Ororubá e Serra do Jucá, no município de Pesqueira, Agreste Central, é a casa dos povos Xukurus e o cenário dos rituais índigenas.

No último dia 6, o povo Xukuru do Ororubá realizou mais um ritual sagrado, que foi composto do toré e a presença de gaiteiros, o Dia de Reis.

Povo Xukuru reunido para toré de Dia de Reis
Dia de Reis é comemorado por indígenas do Agreste com ritual sagrado (Foto: Arnaldo Félix)

Em um dos percursos para chegar até o terreiro do ritual, é necessário sair em caminhada. A companhia do trajeto é uma majestosa vista da aldeia, com montanhas de matas preservadas.

O caminho de pedras não desencoraja índígenas a chegarem também de moto. Mas, tem quem venha também a pé desde o centro de Pesqueira.

Depois da longa caminhada, uma clareira aberta na mata indica a chegada ao terreiro sagrado. Bem ao centro, uma cabana de orações feita de palha de coqueiro e enfeitada com flores brancas e vermelhas.

Indígenas de Xukuru homenageiam Nossa Senhora e Ogum
Ritual conta com uma cabana no meio do terreiro para orações (Foto: Arnaldo Félix)

“Você sabe o significado das florzinhas brancas?”, perguntou Pajé Zequinha a nossa equipe. Respondemos que não, e ele continuou. “É em homenagem a Nossa Senhora.”

Curiosos, perguntamos se as vermelhas também teriam algum significado. Sorrindo e acenando com a cabeça, o Pajé disse: “Tem sim, é em homenagem a Ogum”.

No interior da cabana várias são as velas ascendidas pelos indígenas e por qualquer pessoa que desejasse pedir benções, proteções ou simplesmente agradecer as entidades.

Pajé Zequinha inicia o ritual na presença de indígenas de todas as idades (Foto: Arnaldo Félix)

Com os indígenas ao redor, o Pajé Zequinha inicio o ritual ao lado do Cacique Marquinhos e dos mestres gaiteiros.

O rito seguiu com um toré, elemento fundamental no sistema cosmológico Xukuru, que levantou uma nuvem de poeira, contagiando e convidando a todos para participar do ritual.

Após o toré, apenas os indígenas com barretina subiram para a Pedra do Rei. Barretina é uma espécie de chapéu feita com palha de coqueiro, que serve como marca identitária da etnia e é usada como proteção espiritual dos indígenas.

Toré faz parte da tradição indígena e pode ser usado como parte do ritual, uma dança ou brincadeira (Foto: Arnaldo Félix)

A pedra em questão, também chamada de Pedra do Reino, é enorme e está localizada no alto da Serra do Ororubá, na aldeia Pedra D’água. Lá estão enterradaos o Cacique Xicão e outros indígenas.

Depois do ritual no espaço sagrado, os indígenas desceram e encerraram o rito com mais toré no terreiro. Fechando assim mais um dia 6 de janeiro com tradição, cultura e fé.

Por que e como os indígenas celebram Dia de Reis?

“Quem é o Rei dos Reis?” Pergunta o Pajé Zequinha, logo depois de ter sido questionado sobre o que representa o Dia de Reis para o território indígena Xukuru.

Segundo o Pajé, a data 6 de janeiro é um momento único para as aldeias. “Esse ritual foi e é a força dos indígenas“, afirma.

Aos 92 anos, Pajé Zequinha se recorda quando iniciou o comando desse ritual sagrado, há 62 anos. Para os povos índigenas, o dia 6 de janeiro tem significado e importância diferentes dos da igreja católica.

Pajé Zequinha comanda o ritual sagrado de Dia de Reis há 62 anos (Foto: Arnaldo Félix)

“A festa do Índio, ele faz diferente, mas sendo importante pra Jesus. Você não viu aqui quando eu chamei ‘Reis do Ororubá, Rei do Céu e da Terra e da onde chamar’? A importância pra gente é a terra, que é de onde nós tiramos toda a força, alimento e tudo na vida”, explica Pajé Zequinha.

Além do líder religioso, participam do ritual o Cacique Marquinhos, os Mestres de gaita e os povos índigenas das 26 aldeias que compõem o território Xukuru.

“Desde que a gente começou com a luta pelo nosso território que eu participo todo ano e já faz mais de 50 anos. Eu comecei quando era novo e agora estou com 75 anos. Perdi dois anos, por causa da doença [pandemia da COVID-19], mas graças a Deus eu tô com um prazer grande porque hoje eu estou aqui”, relata o Mestre Medalha.

Responsável pela música que acompanha o ritual, Mestre Medalha é um dos últimos tocadores de gaita dos povos Xukurus.

Ele apresenta o instrumento usado no Dia de Reis chamado de membi. Trata-se de uma flauta que tradicionalmente era feita com madeira de taboca, um tipo de material também usado na produção de pífano.

No entanto, com a dificuldade de encontrar a taboca, os índígenas passaram a confeccionar o membi também com cano plástico.

Mestre Medalha repassa a tradição do Membi para nova geração de indígenas (Foto: Arnaldo Félix)

“Hoje eu tô muito satisfeito porque eu já to vendo 5 mestres de gaita. Eu tava conversando com o cacique ali e dizendo que eu quero que aprenda mais, porque antigamente eu alcancei vários mestres de gaita que já foram embora. O derradeiro que se passou foi um tio da minha esposa, esse se foi e eu fiquei no lugar dele e to repassando para os outros, porque uma tradição dessa não pode morrer, ela tem que ser repassada de geração pra geração”, conta.

Mestre Medalha só lamenta não ter conseguido subir a Pedra do Rei. Devido a um problema no joelho, o mestre de gaita aguardou os demais indígenas no terreiro do ritual.

Fotos do Dia de Reis no território Xukuru

(Foto: Arnaldo Félix)
(Foto: Arnaldo Félix)
(Foto: Arnaldo Félix)
(Foto: Arnaldo Félix)
(Foto: Arnaldo Félix)
(Foto: Arnaldo Félix)
(Foto: Arnaldo Félix)
(Foto: Arnaldo Félix)
(Foto: Arnaldo Félix)
(Foto: Arnaldo Félix)
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